Grande greve na Administração Pública <br>foi um alerta que tem de ser ouvido

ESCOLHAS A forte adesão à greve nacional de 27 de Outubro evidenciou o descontentamento dos trabalhadores da Administração Pública, esperando que as reivindicações tenham reflexos no Orçamento do Estado.

Ficou clara a unidade dos trabalhadores na resistência e na luta

A exigência de outras opções, por parte do Governo e na actual fase de discussão da sua proposta de OE 2018 no Parlamento, na especialidade, foi destacada por Arménio Carlos no dia da greve, desde as primeiras declarações públicas. «Por norma, o Governo invoca que tem compromissos com credores internacionais», mas «também tem de cumprir compromissos com credores nacionais, que são os trabalhadores da Administração Pública», disse à agência Lusa o Secretário-geral da CGTP-IN, na visita ao Hospital de São João. Lembrou que, nos anos de 2011 a 2015, estes trabalhadores «são credores de valores na ordem dos 10 mil milhões de euros» e «são credores de primeira».
Arménio Carlos acompanhou a paralisação na região do Porto, onde esteve com piquetes de greve em alguns serviços. Ao fazer um balanço «muito positivo» da luta, realçou a «grande mobilização» dos trabalhadores e também «uma belíssima compreensão e mesmo solidariedade» por parte da população e dos utentes dos serviços.
Retomando as alternativas fundamentadas que a confederação tinha já divulgado e apresentado, defendeu que «é possível fazer mais e melhor» no Orçamento. Como despesas que podem ser cortadas, o Secretário-geral da Intersindical apontou as parcerias público-privado, os contratos swap, os juros da dívida pública.
Ao início da tarde, junto aos serviços regionais da DGERT (Ministério do Trabalho), quando o coordenador do Sindicato dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais do Norte confirmou aos jornalistas os elevados índices de adesão à greve, Arménio Carlos insistiu que esta representou «um sinal de alerta ao Governo» e apontou a discussão na especialidade como o espaço para, na AR, «ir ao encontro das propostas e reivindicações» que motivaram a luta.

Ana Avoila, coordenadora da Frente Comum de Sindicatos, em declarações à agência Lusa pouco depois da meia-noite, avisou que, passada agora a greve, «ou o Governo responde, ou as pessoas vão ter de se organizar e continuar a lutar».

Numa saudação divulgada durante a tarde, a Frente Comum assinalara que a greve dessa sexta-feira, «com adesões massivas nos sectores da Educação, Saúde, Poder Local, Segurança Social, Justiça, Cultura, entre outros», demonstrava «a unidade dos trabalhadores na resistência e na luta por um Orçamento que passe das palavras aos actos e concretize a efectiva reposição de rendimentos e recuperação das injustiças perpetradas nos últimos anos».
A estrutura sindical mais representativa na Administração Pública, que convocou a greve, considera que «com esta luta, os trabalhadores deram um sinal claro» de exigência de resposta às reivindicações, designadamente:

contra o faseamento na reposição dos congelamentos das progressões,
por aumentos salariais, por 6,50 euros de subsídio de alimentação (valor isento de descontos) e pelo pagamento do trabalho extraordinário sem cortes.

A quem trabalha na Administração Pública «continua vedado o aumento salarial, mantêm- se congelamentos de progressões e, por sua vez, as promoções continuam dependentes de autorização prévia, mantém-se inalterado o valor-base do subsídio de alimentação e do pagamento de trabalho suplementar», concluindo que «o tempo de mudar é agora», recorda-se sa saudação aos «muitos milhares de trabalhadores que hoje pararam, perdendo o dia de salário, para o País poder avançar».
A Frente Comum sublinha ainda que «a falta de pessoal nos serviços não pode continuar» e que os trabalhadores em luta, «defendendo os seus direitos, estão a defender os direitos de todos a melhor Saúde, Educação, Segurança Social, Cultura, etc.».
 

Números e exemplos
da muito forte adesão

A adesão à greve foi superior a 80 por cento em toda a Administração Central, com percentagens ainda mais altas na Saúde e na Educação, onde variou entre 90 e 100 por cento, informou a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais.
Numa nota divulgada ainda no dia 27, a federação da CGTP-IN destacou os distritos do Porto, Coimbra e Lisboa, onde os serviços hospitalares estiveram a funcionar, na esmagadora maioria dos casos, somente com serviços mínimos, e onde encerraram centenas de estabelecimentos de educação e ensino. Mas também noutras regiões, como Braga, Aveiro, Leiria, Setúbal, Santarém e Faro, houve níveis de adesão superiores a 70 por cento, na Saúde e na Educação, e muito elevados noutros sectores, afectando a Autoridade Tributária, a ASAE, o Instituto de Registos e Notariado e a Segurança Social, entre outros serviços.

Na Administração Local, o forte impacto da greve reflectiu-se no encerramento total de várias câmaras municipais e outras entidades, ocorrendo sérias perturbações no funcionamento de serviços essenciais, em particular no sector de recolha de lixo, na higiene urbana e nas escolas, salientou o STAL, que publicou no seu site uma extensa listagem. Aí constam, entre muitos outros casos: a adesão total no sector da recolha nocturna dos SIMAR (Loures e Odivelas); 90 por cento no sector operacional dos SMAS de Sintra e 80 por cento no sector operacional deste município; paralisação total da recolha de resíduos nocturna, nos concelhos de Almada, Moita, Palmela, Seixal e Setúbal, e diurna, em Santiago do Cacém, Sines, Palmela, Grândola, Barreiro, Almada e Alcácer do Sal; encerrados os serviços da CM de Palmela e dos SMAS de Almada, bem como de várias juntas de freguesia do distrito de Setúbal (incluindo sete das oito juntas de Santiago do Cacém); adesão de 100 por cento nos SMAS de Portalegre e nos transportes escolares, higiene urbana diurna e estaleiros municipais de Campo Maior; adesão total na recolha nocturna em Évora, bem como no sector administrativo, Fluviário, Museu e estaleiros de Mora, concelho onde todas as freguesias e escolas encerraram; adesões de 80 por cento ou mais, em Aljustrel, Alvito, Beja, Serpa e Vidigueira; com níveis semelhantes, noutras regiões, surgem a recolha e a higiene urbana nocturnas do Funchal, os estaleiros e o sector operacional dos SMAS da Guarda, os SMAS de Viana do Castelo, o sector operacional e as águas e saneamento de Braga (Agere), os jardins, a higiene urbana e as obras em Vizela, a CM de Vila do Conde, as escolas e os jardins da CM de Faro.

«Convergindo com os demais sectores da Administração Pública e, assim, encerrando cerca de 90 por cento das escolas, os professores e educadores fizeram a maior greve dos últimos quatro anos», realçou a Fenprof, quando divulgou, ao início da tarde, um extenso balanço da greve. A federação afirmou desde logo que a greve de 27 de Outubro, «foi o início de uma luta que, a não ser tida em conta pelos governantes, irá continuar, desde logo, a partir de dia 6 de Novembro e durante todo o primeiro período, com a greve dos docentes às actividades directamente desenvolvidas com alunos, porém inscritas na componente não lectiva».
Para prosseguir a luta «por um descongelamento justo da carreira e sem “apagão” de tempo de serviço, como por outras justas reivindicações», a Fenprof pretende que 15 de Novembro seja um dia nacional de luta dos educadores e professores. Nessa data o ministro da Educação estará na AR para debater na especialidade o Orçamento para este sector.
 

Médicos preparam dia 8

A greve regional dos médicos do Sul e regiões autónomas, a 25 de Outubro, teve uma adesão de cerca de 80 por cento nos hospitais, dando ao Governo «um sinal claro do descontentamento e empenho em prosseguir na luta pela resolução dos problemas», comentou a FNAM, que declarou o seu apoio à greve nacional da Administração Pública, dia 27. A Federação Nacional dos Médicos destacou o encerramento de blocos operatórios e os cerca de 75 por cento de adesão nos Cuidados de Saúde Primários. Responsabilizando «a intransigência e falta de transparência negocial deste Ministério e deste Governo», a FNAM espera «uma contraproposta negocial séria» até 8 de Novembro, data da realização de uma greve nacional.

Guardas prisionais

A participação dos guardas prisionais na greve nacional da Administração Pública foi antecedida por dois dias de paralisações parciais, entre as 7 e as 10 horas, que teve níveis de adesão de 85 a 87 por cento, como disse à agência Lusa o presidente do Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional. Jorge Alves recordou que a luta se deve à falta de cumprimento do estatuto profissional, nomeadamente em relação às tabelas remuneratórias, avaliação de desempenho e pagamento do subsídio de turno e trabalho nocturno, mas também visou protestar contra o regulamento do horário de trabalho, publicado na quarta-feira, 25. O SNCGP convocou uma nova greve às diligências no exterior, para hoje e amanhã e de segunda a sexta-feira da próxima semana. 

Abaixo-assinado nos Açores

Durante o dia de greve, que na RA dos Açores provocou o encerramento de dezenas de escolas, uma delegação do SPRA/Fneprof entregou ao Governo Regional um abaixo-assinado com cerca de 2400 subscritores, reclamando que «Tempo de serviço realizado é tempo de serviço contado» e «Por uma carreira digna e pela concretização dos compromissos negociados». As assinaturas foram recolhidas sobretudo nas escolas, no período de cerca de um mês, informou o sindicato.

Futuro para o Arsenal

Com 80 por cento de adesão à greve, os trabalhadores do Arsenal do Alfeite, em Almada, apoiaram as reivindicações nacionais e fizeram questão de colocar na ordem do dia a urgência de o Governo deixar de comprometer o futuro do único estaleiro público. Como salientou o Sindicato dos Trabalhadores Civis das Forças Armadas e Empresas de Defesa (Steffas/CGTP-IN), no «portão verde» do Alfeite, onde teve lugar uma conferência de imprensa na manhã de dia 27, a falta de autorizações do Governo está a impedir o Arsenal de ampliar a doca seca e de comprar motores para as lanchas em produção para a Autoridade Marítima.
Foi já adiada a entrada em reparação do navio hidrográfico Almirante Gago Coutinho e é preciso garantir que a manutenção do submarino Arpão, em 2018, será compatível com trabalhos simultâneos num navio de superfície, alertou o sindicato, admitindo que os trabalhadores possam decidir em breve formas de luta.

 



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